A casa tinha ficado
praticamente vazia, só os crentes e pelos vistos mais fortes tinham ficado.
Às altas gargalhadas
e fazendo troça saíram as cabeças ignorantes de três rapazes que de certo
pensavam que dada a sua parte fraca, a estupidez de abandonarem o jogo sem
pedirem licença, lhes daria um ar mais macho. Orgulhosos e cegos do perigo,
afastavam-se, lentamente, e só ao longe se aperceberam que não tinha sido boa
ideia, mas o seu arrependimento e medo travaram-lhes os movimentos. Tremendo
por todos os lados viam-se num dilema: ou ficavam ali até os outros saírem ou
caminhavam em direção ao escuro, em direção à encruzilhada onde todo o tipo de
bruxaria e feitiçaria negra era praticada. Naquele momento o escuro das
árvores pareciam-lhes vultos à espera de alguém para a forca, barulhos nunca
ouvidos em todas as suas vidas rugiam ao longe num espaço de cinco minutos…A
agonia, o desespero, o perdão, o arrependimento, talvez de alguém que já partira
em direção ao descanso eterno sussurravam sobre as três nucas de meninos
amedrontados sem idade para aquelas coisas.
E na casa continuavam
os restantes:
-Como te
chamas?-perguntava.
O copo deslizava
lentamente…Alguém soletrava:
-A-J-U
E o outro completava:
-D-A, ajuda.
-Cala-te!-dizia o
mais medricas com lágrimas nos olhos prestes a lavar a esquina da mesa.
E assim continuavam:
-O que podemos fazer
por ti?
Seguindo com os olhos
os movimentos lentos e muito silenciosos do copo, dizia ele em voz alta os
seguintes nomes:
-R-I-C-A-R-D-O;
A-F-O-N-S-O; G-A-B-R-I-E-L…
Olharam-se fixamente
sabendo que os nomes apontados pelo copo, eram os nomes dos três rapazitos
irritantes que fizeram troça de quem nisto acreditava e que saíram do jogo sem
autorização. Dizia o Renato tentando compor as coisas:
-Perdoa-lhes, por
favor…!
Só vos digo, aquilo
descontrolou-se mesmo. Os nossos dedos estavam na base do copo, sentimos o
vidro estalar e uma forte rabanada de vento. Cheios de medo juramos nunca mais
ali voltar. Ainda hoje tento esquecer aquela noite…o terror tinha-se instalado
na encruzilhada, os nossos olhos gemiam e gritavam pelos nossos amigos.